quinta-feira, 9 de outubro de 2008
quarta-feira, 8 de outubro de 2008
terça-feira, 7 de outubro de 2008
POEMAS CITADOS
Ao ler uma tentativa de definição de poesia feita por Antonio Cicero, me vi diante de dois belos poemas de Bandeira e Borges respectivamente. Comoveram-me e quero dividir essa emoção, para quem quiser experimentá-la, se for possível agora. A meu juízo, não deixam de ser poemas sombrios. Tratam de morte e do efêmero da existência. Segue junto um poema dedicado a mim, feito por um amigo.
O RIO
Ser como o rio que deflui
Silencioso dentro da noite.
Não temer as trevas da noite.
Se há estrelas no céu, refleti-las.
E se os céus se pejam de nuvens,
Como o rio as nuvens são água,
Refleti-las também sem mágoa
Nas profundidades tranquilas.
Manuel Bandeira, Petrópolis, 1948
NUVENS (I)
Não haverá uma só coisa que não seja
Uma nuvem. São nuvens as catedrais
De vasta pedra e bíblicos cristais
Que o tempo aplanará. São nuvens a Odisséia
Que muda como o mar. Algo há distinto
Cada vez que a abrimos. O reflexo
De tua cara já é outro espelho
E o dia é um duvidoso labirinto.
Somos os que se vão. A numerosa
Nuvem que se desfaz no poente
É nossa imagem. Incessantemente
A rosa se converte noutra rosa.
És nuvem, és mar, és olvido.
És também aquilo que perdeste.
Jorge Luis Borges (tradução literal de Antonio Cicero)
NÃO-FREVO
ao poeta Falcão
Retoca as intra-tintas
Desbotadas pelas angústias
Da decepção
Em tuas línguas palavras
A aparência dos vazios
Nos espinhos sozinhos
Em teus pés caminhos
Onde deixas o escuro-claro
Do que és
E o bruto terno que lavras
(esquece as estrelas e a lua)
Retoca
A incorrigível ferida
- não chaga -
Aberta pela vida de teu choro
Sem dolo
Deita-te a teu colo
Livra-te
Do falso lodo
Vela algum herói
Ou se quiseres
Caminha
Para o teu sincero
E sereno dentro
Atento
Lá onde o tempo
Não ri à toa
E a melancolia
É também ali
Melodia boa
Avelino Afonso, junho de 2008
Ao ler uma tentativa de definição de poesia feita por Antonio Cicero, me vi diante de dois belos poemas de Bandeira e Borges respectivamente. Comoveram-me e quero dividir essa emoção, para quem quiser experimentá-la, se for possível agora. A meu juízo, não deixam de ser poemas sombrios. Tratam de morte e do efêmero da existência. Segue junto um poema dedicado a mim, feito por um amigo.
O RIO
Ser como o rio que deflui
Silencioso dentro da noite.
Não temer as trevas da noite.
Se há estrelas no céu, refleti-las.
E se os céus se pejam de nuvens,
Como o rio as nuvens são água,
Refleti-las também sem mágoa
Nas profundidades tranquilas.
Manuel Bandeira, Petrópolis, 1948
NUVENS (I)
Não haverá uma só coisa que não seja
Uma nuvem. São nuvens as catedrais
De vasta pedra e bíblicos cristais
Que o tempo aplanará. São nuvens a Odisséia
Que muda como o mar. Algo há distinto
Cada vez que a abrimos. O reflexo
De tua cara já é outro espelho
E o dia é um duvidoso labirinto.
Somos os que se vão. A numerosa
Nuvem que se desfaz no poente
É nossa imagem. Incessantemente
A rosa se converte noutra rosa.
És nuvem, és mar, és olvido.
És também aquilo que perdeste.
Jorge Luis Borges (tradução literal de Antonio Cicero)
NÃO-FREVO
ao poeta Falcão
Retoca as intra-tintas
Desbotadas pelas angústias
Da decepção
Em tuas línguas palavras
A aparência dos vazios
Nos espinhos sozinhos
Em teus pés caminhos
Onde deixas o escuro-claro
Do que és
E o bruto terno que lavras
(esquece as estrelas e a lua)
Retoca
A incorrigível ferida
- não chaga -
Aberta pela vida de teu choro
Sem dolo
Deita-te a teu colo
Livra-te
Do falso lodo
Vela algum herói
Ou se quiseres
Caminha
Para o teu sincero
E sereno dentro
Atento
Lá onde o tempo
Não ri à toa
E a melancolia
É também ali
Melodia boa
Avelino Afonso, junho de 2008
Assinar:
Postagens (Atom)