sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

ELUCUBRAÇÕES SIMPLÓRIAS NUM COPO DE FEL

Muito se escreveu por aí sobre as diferenças entre a "geração 68" e a juventude que ora esparrama-se pelas cidades. Marcaram-se diferenças, fizeram analogias e estabeleceram hierarquias qualitativas. Surpreende-me que não chamam a atenção para algo tão visível e aparentemente simples: a quantidade de mamíferos desvairados. Numa das depredações sem finalidade (e mesmo que a tivessem), o número chegou a 800. Salvo engano, 14 foram detidos e logo liberados. Pra quê?! A detenção e a liberação.
Deixando de lado minha ranzinzice habitual - só por um átimo - (da qual chego a rir às escondidas), os arrastões de Praia Grande e São Vicente não me fizeram pensar com cuidado (deveria?), mas, ler aqui e ali juízos de "especialistas". Sobre estes refleti um pouco, com um Riobaldo debaixo do braço: "E tudo me deu um enjoo. Tinha medo não. Tinha era cansaço de esperança."
Um traço comum a eles são as marteladas insistentes sobre a imagem que figura uma geração movida a sonho, utopias e visão prospectiva e, por contraste, outra que, colada a um presente eterno, tem, na mira, somente sonhos de consumo, frustração e niilismo. Num país (e em tantos outros) que não lhe oferece futuro e esperança. Noções que caem muito bem em calendários edificantes. A calhar: passagem de ano, folhinhas novas, "cachaça" em abundância e arrastões vândalos. "Alegria" e palhaços no salão.
Relevando o arbítrio da compartimentação dos grupos sucessivos em "gerações", como gostam de fazer, não deixa de vir a mim a cena daquele cavalo diante da cenoura que lhe aplicam, presa num pau, à frente dos olhos e das ventas. A montaria se move por motivação efetiva, embora infrutífera, e o cavalariano se serve galhardamente.
Nossa cenoura são os projetos de vida, os objetos materiais do desejo e amores buscados. Resultam em desvirtuamentos, acomodações inesperadas, fracassos mesmo, maquininhas quebradas, pre-obsoletas e corações dilacerados ou atolados em tédio. Disso resulta que nada tem muita importância afinal. O que nos espera não tem pressa nem manda aviso. Ou manda e o homem não vê. Não quer ver.
Num pesadelo recorrente, vejo uma multidão de bocas vociferando opiniões. Ao lado e acima, uma voz tonitruante que insiste: "continuem a cavar!".

terça-feira, 13 de janeiro de 2009


"É A BAHIA!"


A Bahia sempre me surpreende; por suas novas manias e coisas que acabo esquecendo ainda que venha aqui com muita freqüência, como já escrevi por aí. Falo abaixo sobre as atitudes da vez.

Nos supermercados de grande porte, noto o seguinte: na fila para o caixa-rápido, vejo quarenta pessoas com quatro a oito volumes cada uma. Até chegar minha vez, dá uma média de 240 volumes. Desanimo. Vou para os caixas comuns e me deparo com trinta volumes em minha frente, e me safo do pesadelo. Não entendo por que os enfileirados não fazem o mesmo cálculo. E aquela fila vai se ampliando. Encasqueto-me!

O gosto pelo ilícito é nacional, e é de todos. A fúria legiferante de nossos parlamentares obriga os brasileiros a isso. O negócio deles é dificultar para que o país pareça o que eles imaginam ser civilizado e ordenado. A despeito da burrice, há normas de conduta que não dá para deixar de cumprir. O trânsito é um prato cheio.

Vejo aqui uma frequencia (além da usual) de motoristas trafegando na contra-mão, em ruas do interior dos bairros, mormente nos domingos. Outra: não sabem para que serve o pisca-pisca. Há exceções, claro! (a gente tem de escrever isso). Como sou pedestre, tenho de ter atenção redobrada.

Há uma coisa boa: os motoqueiros são em pequeno número e não buzinam tanto. O trânsito é mais leve (não sei até quando, pois baiano adora automóvel). Mas há o lado negro: respeitar semáforo não é o costume.

Pedalar na orla é um problema estranho. Há uma ciclovia e uma pista para pedestres. Estes entendem que aquela é para caminhar. Portanto, a ciclovia é para quem faz caminhadas. Se você dá uma buzinadinha ciclística como alerta, é encarado como inconveniente. E os baianos não saem do lugar; você, ciclista, que invada a pista dos pedestres. Entenderam? Não se preocupe, "é a Bahia!"

O Código Nacional de Trânsito determina que, em caso de acidente sem gravidade e vítimas, os condutores devem retirar seus veículos da via para que o trânsito flua. Outra manhã, assisti a uma cena inusitada: um carro bateu na traseira de outro, na faixa esquerda da avenida da orla. Lá estavam os motoristas no bate-boca habitual. O trânsito até que andava, mal, é verdade, mas andava. Chegaram os policiais. E o inferno se instalou. O que eles fizeram? Criaram um bloqueio seguido de desvio alternado a fim de que os "colidentes" prosseguissem em seu litígio inútil. Danos materiais: dois parachoques arranhados. O trânsito parou por dois quilômetros e as buzinas deram início a seu concerto. Apoquento-me.

Por falar em buzina, os baianos motoristas adoram buzinar, a qualquer hora do dia, em qualquer lugar, para qualquer coisa. Um singular exemplo: quase chegando ao destino, pegam o celular e ligam pra pessoa que vão pegar. Devem dizer: "Estou chegando, desça!". Tudo já deve ter sido previamente combinado pelo celular, é claro! Ao estacionarem, começam a buzinar para avisar a pessoa que já chegaram. Geralmente, estou passando do lado. Fico amolado. E, na madrugada, a coisa pega: não usam sinal de luz para alerta, em cruzamentos desimportantes. Buzinam para acordar o bairro! O problema deve ser com qualquer sinal de luz, lembre-se do pisca-pisca.

Em tempos de crise, os baianos resolveram fazer uma economia curiosa na taxa de condomínio: dispensaram, em alguns edifícios, o porteiro do dia. Os prédios ficam às moscas e as entregas de variados tipos ficam um caos. Se o PCC descobrir, logo teremos por aqui arrastões matutinos e vespertinos. Legal, não?!

Outro problema antigo do qual havia me esquecido é o troco nas compras. Por mais que você facilite, os baianos nunca têm troco. Em qualquer natureza de estabelecimento comercial. Não adianta reclamar, é atávico.

Dizer que os baianos são preguiçosos não cola. Essa gente que assim o faz confunde simpatia, cordialidade, gosto por festas, qualquer uma, e veneração pelo sossego com vadiagem. Muito da economia baiana é movido por isso mesmo. Volta e meia, me pego sendo cumprimentado com um amável “Bom Dia!”, por estranhos, bem de manhãzinha. Adoro. Pior é que o Brasil vai perdendo isso a passos largos.

Para terminar, caso contrário posso sofrer um atentado na rua, duas outras coisas, uma que faz nosso conforto e outra que azucrina os caminhantes: em todo canto, há barracas vendendo alimentos: vegetais variados, temperos verdes, pimentas, frutos do mar etc. A gente nunca precisa andar muito. A vigilância sanitária nunca passou por ali, nem passará. A outra são as possuidoras de cãezitos (os possuidores são em pequeno número). É raríssimo você ver alguém com seu devido saquinho plástico higiênico. Então, pedestres, preparem-se para os dejetos caninos ao longo das calçadas esburacadas. Tomem seu rumo, que é a rua e desputem com os automóveis buzinantes. "É a Bahia!"

Ah..., nesta época do ano, chove pela manhã e o céu abre à tarde. É o inverso de São Paulo. Salvador continua linda. Escurece rápido e cedo, e as mulheres também adoram a manada-fashion: blusas pink ou cor-de-rosa e jeans. Não adianta buzinar.