Sobre isso não há novidade a dizer: o
tempo e o espaço são tão abstratos que são como se não fossem, não existissem.
Assim, o que é um lugar? Quando o lugar é? As pessoas confundem lugar com
coisas que estão distribuídas de um certa forma num lugar. A matéria
genericamente está num "onde" qualquer, mas o lugar mesmo, em si, onde
está? Já sei: onde estão infinitos pontos. Mas o que é um ponto se são
infinitos? Não têm medida. O ponto não é, sendo.
Tomam o tempo como medida do
movimento. Para além da quantificação, da matéria (da matéria escura) e do
espaço, o que vem a ser o tempo? Ele é pensado e percebido em sua natureza de
um ser desconhecido, impensável e incognoscível que é – o enigma dos enigmas,
como dizem. Notado nas coisas que se modificam, que não param de se modificar;
indiretamente portanto, como se fosse o nada que se reflete no mundo, se
impondo, como se existisse. Talvez exista mesmo, na forma informe do tempo e do
espaço, ora!
No universo, houve um começo (será?),
mas não o antes do começo, pois não havia o tempo nem seu inseparável
parceiro,o espaço, que não deu o ar da cara pelo não-ali. O que havia então? Havia o
não-havia.
O que faço nessa interminável noite
que acomoda, sobre meu ombros, a insônia de cada fio de cabelo? Os relógios
conversam entre si, sem me dar a menor importância. A mariposa medita, num
canto da parede, sobre a remota possibilidade de, um dia, ser quem sou e eu ser
quem ela é. É seu singelo e secreto desejo. Eu sei. E assim coabitamos o quase
escuro e o quase silêncio de nós mesmos, na fazenda dos bons sonhos que não nos
querem visitar, enquanto ainda chove lá fora.
A. R.
Falcão - outubro de 16