sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014


BREVE

 
Até que meu hoje

Chegue

Para dizer-me: não há nada

A fazer aqui.

A tampa na caneta,

Os papéis dobrados

E o caminho escuro das paisagens que se engolem

No mais escuro dos quartos

Silenciados

Dos hospitais públicos.

Vestido e penteado,

Paciente e pronto.

A. R. Falcão - fevereiro de 2014

"THE THRILL IS GONE"

 

Foi de Lucía, foi Arnesto.

As mangas quedaram arregaçadas

Sobre esquifes

De quem nos abriu

Envelopes

Onde nos escondíamos

Mortos, adormecidos.

Vai o sol e vêm agora as nuvens

Pesadas, no céu de chumbo derretido.

Abro as janelas

Para o dia que começa

Mais um verão enganador.

Meus olhos me abrem

Para dentro

Dias que foram

Mais felizes

Na música

Que desenlutava as noites

Mais sem lua.

A. R. Falcão - fevereiro de 2014

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014


PLUMAS

Não gosto de galos.

Gosto das galinhas

E seu discreto ciscar.

Refugo a soberba empavonada.

Não gosto da lua cheia,

Gosto da insidiosa,

Insinuante, insinuada

Lua nova.

Não gosto de comida quente,

Anunciada, impositiva.

Gosto daquilo que meus lábios

Recebem sem surpresas.

Não gosto de mim.

Gosto de um mim diminuído.

Mínimo.

Nos confins das gavetas

Esquecidas.

A.   R. Falcão - fevereiro  de 2014

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014


INSETOS

O engenho letal,

Humano,

Jaz inerte sobre o piso

Cerâmico.

O engenho dos cupins,

Destrutor,

Jaz lôbrego sobre o chão

Telúrico.

Bastaram dois dias

Para uma confraternização anunciada

Fadar-se ao fracasso

Num embate cruento;

Para uma convivência amena,

Com mais de sete anos,

Acabar assim

Na mútua estupidez.

À morte de uns,

Muitos,

Seguirá a solitária,

A inescapável morte do outro

Na terra que o espera.

A.R. Falcão - fevereiro de 2014