sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Crônica da palavra assassinada

Um problema que vem, há muitos anos, preocupando escritores, filósofos e estudiosos é o empobrecimento da linguagem nas sociedades de massa, chamada também de cultura da nova oralidade. O que tem assustado tanto? O crescente analfabetismo funcional e o abandono da civilização da escrita, base de todo o conhecimento desenvolvido pelo Ocidente.
Como se verifica isso? Na pauperização da fala de todos, entendida como redução de repertório vocabular, incapacidade de compreensão de um texto elementar, desarticulação sintática, escravidão a frases feitas, jargões, slogans; aumento crescente do consumo da baixa literatura, queda mundial da venda de jornais e baixa qualidade da educação. Apenas um exemplo eloqüente: lingüistas, num exame da língua inglesa moderna, perceberam que o número de palavras no uso cotidiano da maioria da população poderia já estar reduzido a trinta e quatro. A maioria do atos de comunicação corrente se serve dessa miséria verbal alarmante.
No Brasil, é muito fácil notar o mesmo fenômeno na fala dos jovens: um número desmesurado de palavrões e muletas verbais como “mano”, “bagulho”, “tipo de”, “saca”, “meu truta” etc. Entre adultos (escolarizados, é bom que se diga), pragas intoleráveis como “a nível de”, “resgatar” (onde foi o seqüestro?), “como um todo”, “auto-estima” (por que não o nosso velho e bom amor-próprio?), “stressar” (por que não o nosso velho e bom estafar?) etc. Nesta mesma faixa etária, jargões profissionais obscuros que ocultam mediocridade monumental, teses acadêmicas inúteis e ilegíveis.
Numa escola em que trabalhei por quatro anos, fiz um levantamento sistemático entre os professores: ninguém assinava um jornal ou revista, liam apenas auto-ajuda e bobagens esotéricas. O que pode resultar disso?
As pessoas (as que ainda falam sem grunhir) não perceberam que tragédias como o nazismo e o stalinismo começaram seus crimes inomináveis perseguindo, prendendo e matando escritores; mas antes fizeram um competente trabalho empobrecendo a grande língua alemã, destruindo a literatura russa. No Brasil, o mesmo trabalho já começou.
Sejamos responsáveis, começando por desligar a televisão; depois, parar de tagarelar inutilidades em todos os lugares e aparelhos; mais tarde, fazer silêncio. Por fim, redescobrir as palavras em toda sua delicadeza e força criativa. Quem sabe voltemos a pensar, falar e dialogar de novo!

Antônio Rebouças Falcão

2 comentários:

Rodrigo M. Freire disse...

devo dizer que concordo.. e compadeço.

muito bom!
por que não dizer...?

Rodrigo M. Freire disse...

vou publicar no meu site o link para este, e este seu texto em reviews! ok? aliás, já publiquei! qualquer coisa processa. tá tranquilo! rs