Nesse dezembro, no aeroporto, assisti apavorado à nova patalogia de massa: a manada se "fotografando" compulsivamente com "smartphones". É tola e manipulada, na ilusão de agir quando agem esperta e calculadamente por ela, fazendo-a "pensar" que tem a iniciativa. As aspas se justificam, porque pensar não é atividade própria de manadas. Espero por horizonte sombroso.
Essa digigrafia mórbida (porque fotografia não é) é um esforço retórico pelo vazio de si. Aqui, um retórica "desverbalizada" através da imagem volátil de um instante assombrado ou irrelevante. Para a manada, o verbo é complexo. Sua oralidade é bruta e pobre. Não falam, tagarelam asnices.
Se, na infância remota, havia o proverbial "Ó eu aqui, mamãe!", hoje, nos malditos "selfies", fica assim: "Ó eu aqui, EU!". A tecnologia perigosa adoece mais as pessoas doentes numa velocidade aterradora. Quase todas. É delas "o reino dos céus".
Fica que melhor é nada a "fotografar"; quase nada a dizer. Talvez, devêssemos, em humildade, solicitar o acesso à majestade do escuro e do silêncio. Quem sabe a única maneira de sermos, um dia, salvos dessa praga. Hoje, pessoas de fato veem-se na contingência de habitar o Hades povoado pela horda das maquininhas. Ágrafos dedilhando telas brilhantes sem parar.
Pessoas de fato em oposição a pessoas desintegradas , que são aquelas atreladas obsessivamente à conectividade virtual das redes sociais e fones de ouvido, repare. Eis a manada mundial escrava das grandes corporações da indústria cibernética. A pessoa de fato é dotada de capacidade de observação, reflexão, imaginação e criação, sem a dependência inicial de quaisquer ferramentas eletrônicas que não seu próprio pensamento. Assim se põe a relacionar-se com o mundo à volta, mesmo na sala de espera de um consultório. Note-a: aqui, não usa maquininha nem folheia revistas estúpidas. Não precisa, pensa. Algo doloroso para a pessoa desintegrada. Se vê a tela, não vê o mundo.
Para o imbecil contemporâneo, a tela é o mundo. É tudo muito triste e inexorável. O desintegrado vai pagar caro, com a boca seca e a o estômago da alma vazio do legado da grande cultura. Burros compactos e complexos e, no entanto, sandeus.
A. R. Falcão - dezembro de 2014
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