segunda-feira, 23 de julho de 2007

O Sempre do Mesmo

Dezembrite em Sampa

A chamada época das festas não é dos momentos que mais aprecio. Poderia justificar alegando o congraçamento hipócrita e o consumismo desvairado da troca de presentes, como habitualmente se faz, mas prefiro me ater a uma espécie de loucura coletiva que toma conta dos corações e mentes: pessoas estafadas, gritarias, olhares e falas tensos, motoristas fora de controle, engarrafamentos monstruosos, calçadas intransitáveis, fedor de panetone e assim por diante.
Esta espécie de preâmbulo do inferno que faz a felicidade inocente de muitas crianças e a histeria de jovens mal-educados prefiro longe (e muitos adultos concordariam comigo em segredo). Pois é esta busca de distância que acaba me levando inexoravelmente à mesma indesejada loucura. Este fenômeno tem um nome e está lá no título.
Em minha fuga, desta vez, resolvi procurar um lugar estranho a meus hábitos de eremita e longe o bastante de minha casa. Seria doido assumido já que não podia escapar. E lá fui eu atrás de um sinistro e antigo edifício, todo pichado, na Lapa, que me chamara atenção em outras andanças. Ali, soube que acontecem animados bailes para damas e cavalheiros da terceira ou última idade, ou a boa idade, ou a puta que pariu. (quem saberá? A morte não manda aviso).
Como não sou dançarino e comecei a dobrar o Cabo da Má Esperança, estava lá para apreciar e afugentar o tédio ou a ira insana. E apreciei, mas também fracassei. E conto por quê.
Bailes assim não variam muito: pares no salão, roupas e penteados inimagináveis, conjunto musical modesto e de repertório banal, mas adequado ao distinto público, bebida barata com preços no olho da cara e muita solidão dissimulada. Como a minha. Procurei uma mesa de canto que me permitisse um ângulo privilegiado, sentei sem barulho e chamei o garçom. Eu estava em outra.
O curioso, inesperado e surpreendente, que me deu a graça do prazer neste mês fatídico, foi encontrar uma orgulhosa alegria, o envolvimento sincero entre os casais que dançavam ou conversavam nas mesas, um sentido de hombridade e delicadeza nos movimentos que o Brasil e sua música perderam há muito. Estava satisfeito e repentinamente curado. Foi pouco, fiquei ali não mais que trinta minutos, já era o bastante; entretanto, em certo sentido, foi uma das duas melhores coisas do sempre louco dezembro. Saí mais leve para dentro da noite paulistana.
E onde fracassei? Bem, o garçom não me atendeu, ninguém se interessou por minha conversa, nem sequer me olharam, mesmo sendo claramente um excêntrico desvairado no lugar errado. A felicidade ali era só deles, com toda a justiça deste e do outro mundo.

antônio rebouças falcão

Um comentário:

teka disse...

Que tal pensar com coração e sentir com a mente?
Amei reencontrá-lo e coincidentemente , em mais um dezembro, que se esvai...
Abraços,
Terezinha Falcão