sábado, 23 de outubro de 2010

TRECO CHULO

Desconfio com gravidade que as imagens televisivas, particularmente aquelas de programas noticiosos, promovem a amnésia entre seus telespectadores. Chama-me a atenção o caráter freneticamente sucessivo da montagem – um amontoado de quadros que se sucedem em blocos, alternados pela entrada de anúncios comerciais repetidos à exaustão. No rádio, não é diferente. É sobejamente sabido que a repetição insistente acaba por distrair o receptor; esvazia o significante de qualquer sentido. Como aquele grafite que você vê todos os dias. Sempre ali, imutável.

As cenas, as narrações, os closes invasivos, a banda sonora etc. acabam por se equivaler. Tanto faz se apresentam a comemoração de um gol ou um assassinato. A imagem que segue “esfria” a que antecede. O telespectador as retém por pouco tempo, porque as novas imagens precisam ser seguidas; sobre elas já foram criadas expectativas. É desejado um telespectador-consumidor ansioso. Ele não vê, de fato, de forma reflexiva; torna-se um acompanhador acrítico de sucessões.

Os produtores e patrocinadores dos programas não obedecem a uma lógica minimamente didática, explicativa ou informativa que permita o advento do conhecimento. Eles são o Zorro e a tigrada é o Tonto. Monta-se a pauta por um princípio quantitativo de tempo e cifrão; tantos reais ($) por segundo nas inserções comerciais, cobradas pelo índice de audiência, medido sabe-se lá como – algo na fronteira do opaco – entremeados por quadros sucessivos de imagens impactantes. Quanto mais, melhor. Tomado pela ansiedade, o telespectador come e bebe. A TV faz engordar. Sem novidade.

A contextualização dos eventos é de uma pobreza alarmante. Assim, o público é incapaz de relativizar e relacionar o representado nas imagens; ele se pronuncia por absolutos: contra/a favor; prende e mata/educa e ampara; amplas generalizações em juízos sumários: “Você viu? Fulano foi assassinado! Esse mundo não tem mais jeito!” E não vão além disso, o falante e o ouvinte. Como narcótico, a redundância decorrente os asfixia na burrice e ignorância.

O telespectador típico, que não tem um suporte de leituras ou outra fonte de informações que possibilitem a ele um debate íntimo (ou não) de concepções e noções, vê-se em meio a uma enxurrada de insultos e maravilhamentos; crendices e mistificações. Quando conversam entre si, limitam-se a narrar, um para o outro, o mesmo que ambos “viram”. Não vão além, nem têm como. São ignorantes do que pensam saber. Quase que não que nem.

Hoje, no pântano político a que os brasileiros se viram atirados e em que permanecem atolados, a televisão aberta permite apenas um ser contra a favor de nada não a favor. Esgazeados sobre uma tumba. Fuja deles e dela. É uma medida sanitária.

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