segunda-feira, 16 de novembro de 2015


COM TODO RESPEITO*

Muitas pessoas com fé de base religiosa pensam que podem transformar o mundo, mudar a realidade à sua volta. Não me refiro à determinação louvável de quem deseja mudar seu comportamento, mas àqueles que esperam alterações positivas e benéficas naquilo que não lhes concerne, naquilo em que não podem interferir. São os esperançosos "de boa fé" que imaginam resolver problemas graves e curar doenças de parentes próximos, amigos, ídolos com rezas e trabalhos místicos de acento esotérico. Uma rematada tolice, daí a proliferação de picaretas, espertos, patifes...

Nada contra a crença e a fé dos devotos. Elas os consolam na dor, o que não é, em si, um mal. Ajudam seu psiquismo, seu equilíbrio emocional em suma, os afastam do desespero. É um benefício universalmente cultivado. Resta aos céticos a resignação, com que convivem apaziquados.

Como a maioria dos semáforos paulistanos para pedestres (ou todos, a meu juízo e pela constatação empírica) estes, às vezes, coincidem com a interrupção do tráfego veicular, em sendo acionados. Da mesma forma, a cura,  o arrefecer do sofrimento podem "acontecer" após rezas, benzeduras e promessas ininterruptas. Se acontecerem, é que os "pedidos" foram atendidos.

 Os crédulos, em geral, são rígidos e inflexíveis em suas convicções. Ingenuidade, ignorância ou autoilusão. A fé lhes basta; a reflexão e dúvida sistemáticas são, neles, rarefeitas, porque inalcançáveis ou insuportáveis para suas fragilidades existenciais. São os sem-Iluminismo, ficam entre um misticismo arcaico e um ocidentalismo meramente comportamental. Não passam sob escadas embora sejam contemporâneos e digam ser dotados de razão e vontade (leia-se fé). Não percebem a contradição, são assim mesmo.

Outra: 86% da bancada evangélica e do eleitorado* entende que acreditar em deus torna as pessoas melhores; ignora que a grande maioria dos presidiários condenados, cumprindo pena, e, dos homicidas são crentes. Sobre isso se cala. Sem comentários.

O Alcorão* começa assim: "(...) 2. Esse é o Livro, nele não há dúvida alguma. É orientação para os piedosos [devotos]. (...) que creem no [no Alcorão] que foi decidido do céu para ti [para o profeta Muhammad] e se convencem da Derradeira Vida." A Bíblia não é diferente; é ver o Pentateuco e Evangelhos, por exemplo.


Nisso que chamam  Brasil, outros, “pátria educadora”, desde sempre, reza-se por saúde, segurança, justiça, chuva, promoção econômica, emprego, sorte, bonança, amor, dinheiro etc. Por isso é o país mais feliz do mundo, que o digam os camponeses vítimas de seca severa, os urbanos vítimas de enchentes recorrentes, mães e bebês vítimas da microcefalia no Nordeste, indígenas do sul mato-grossense, os atolados no deserto de lama tóxica em Minas, as vítimas de roubos,  latrocínios ou violência policial, mais mortes por assassinato (mais de cinquenta mil por ano) que os mortos norte-americanos na guerra do Vietnam (mais de cinquenta mil em dez anos) e tantos outros na amargura escura. Se sofrem ou morrem é porque estão em pecado e não sabem; o Brasil é o melhor país do mundo, é o que também dizem.

No buraco em que estamos,  a prática rezadeira se espalha como aedes aegypti em São Paulo, no verão. Que dizer dos inocentes mortos em Paris (13. 11. 2015), dos refugiados afogados no Mediterrâneo a toda hora e muitos mais por esse mundo afora? Por onde andam deus, deuses, entidades, magos e santos que não os protegem? Não foi Jesus quem, na hora H, disse ter sido abandonado pelo Pai? Pois é, leiam a Bíblia a que temos acesso já que não alcançamos o aramaico, o grego ou o hebraico. Distância de textos apócrifos tidos como “Bíblia”, reescritos por “pastores” patifes, enriquecidos,  para pobres fiéis sem instrução. Um crime.

 Aguardem as tragédias que sempre vêm por aí, provocadas pelo homem ou pela Natureza indiferente. Não adianta rezar, "meu irmão". Seja o que for, será. O melhor consultivo é o acaso que nos atormenta (ou não). Pergunte a ele; é infalível.

* Por quê? Pra quê? Pra nada.
* Fonte: Datafolha.
* NASR, Helmi (realizador). Nobre Alcorão, tradução do sentido para a língua portuguesa. Society of the Revival of Islamic Heritage – Complexo de Impressão do Rei Fahd.

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