17H, AINDA NO INFERNO
São Paulo tem as paisagens acústicas mais
insuportáveis do planeta. Em meu edifício, como em tantos outros, alguém deve
demolir internamente um apartamento. É durante o dia, você não pode reclamar,
nem fazer nada no mesmo sentido. Impossível conversar com alguém, atender um
telefonema ou ouvir uma reportagem radiofônica (meu caso) a 30cm do aparelho.
Acrescente sirenes, polícia, ambulâncias, motocicletas e motores de vária
natureza. Só a morte traz silêncio.
A máquina furadeira ou britadeira o deixa
no chão, embaixo de qualquer móvel com os dedos nos ouvidos. Você tem que
desaparecer para lugar nenhum. Direito a que, homem branco? Sua casa já não
existe; você é sumariamente violentado. Ligue para a portaria e será tido como
chato, porque estão todos surdos pelos fonezinhos de orelhas. Isto aqui é um
desabafo inútil à frente de “assassinatos” ou violência da ordem alegada.
“Não faça nada até 17h” diz lá o zelador
pelo interfone. É Lei do condomínio; enquanto engole sapos, até que vomite um
dragão de sangue e fogo. Não tem poder, a cidade é santa, a ordem Humana está
desmanchada e São Paulo é incontrolável, desgovernada e incontornável. Ir pra
onde? Para o inferno da rua, e adoeça. “Qualidade de vida” é a p... Morte,
morte e morte, o silêncio que esperamos no fim de tudo - ele nos tem de
direito.
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