quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

CENAS DA BAHIA

1. Ié foi o motorista de meu tio por quase toda vida. Era um figuraça, com um nome sublime.
Certa vez, aqui em Salvador (ele vivia e trabalhava em Minas), desrespeitou um semáforo na cara dura, diante de um policial de trânsito. E sobrou pra ele:

- Encosta aí, faz favor! Documentos! Você sabe que passou o farol vermelho?
Na maior naturalidade, Ié respondeu-lhe:
- Sabe, seu guarda, eu não sou daqui.
- E daí?! O Código Nacional de Trânsito é pra ser respeitado. É nacional!
Tudo muito complicado para Ié:
- É que, lá na minha terra, a gente não para não.
- Como assim?! Você é xarope?
- Uai, a gente só para quando não tem jeito. Lá é assim.
- !!!!

2. Na Pituba, aqui pertinho, uma mocinha e um senhor de idade avançada ficam, juntos, lado a lado, numa barraquinha, o dia todo. Vendem coco fresco, bolo, biju, mingaus variados, essas comilanças daqui. Ele se chama Florisvaldo, ela deve se chamar Rita, tem cara de Rita.

- Bom dia. O Florisvaldo já chegou?
- Não sei não senhor.
- Ele tem uma hora certa pra chegar?
- Não sei não senhor.
- Mas como?! Vocês trabalham juntos todo dia, o dia inteiro...
- Não leva a mal, é que eu não gosto dele. De jeito nenhum.
- E vocês trabalham coladinhos, a um metro do outro, dia sim e dia não também. Um não sabe do outro? É gozado.

Ela prosseguiu em sua amalucada tarefa de teclar seu celular, coisa que não interrompeu nem por um segundo. É que o interlocutor, pessoa empírica, foi destronado para sempre. Interlocutor é a maquininha. Assim, não poder sabe de Florisvaldo e nem se lembrará de mim.

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