ISTO E AQUILO LÁ
Penso numa fotografia de alguém que
não conheço. Nela, não há movimento nem tempo, esse par inseparável. Se o tempo
dá o contorno da figura, o movimento dá sua fisionomia. Então, a fotografia
daquele desconhecido me informará muito pouco sobre ele, como os retratos de
documentos. Eu, como qualquer observador, "ficciono" aquele par
mencionado: o movimento e o tempo são construções minhas. A necessidade de dar
vida a quem se apresenta como morto no papel. Assim, a figura sairá andando por
aí, numa narrativa inconclusa, a menos que ela surja da imagem numa página
policial de um periódico e, empiricamente, esteja de fato morta. Será? Ela não
teve um passado, a narrativa do que foi?
A imaginação faz de um observador
comum, por instantes, um romancista amador. O ser humano é, naturalmente, um
criador de criaturas, a começar de si, depois vêm os outros. Por isso, a coisa
não pode dar certo, sempre, e nossa vida não passa de uma aproximação, mais ou
menos rente, imperfeita. As identidades não se confundem. É seu encanto e seu
fracasso.
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